Entrevista com a
Revista Digital
Polo Creative

Lea Marcondes | Andando com Jesus

Quem é Lea Marcondes

Léa Marcondes é psicóloga, bióloga, professora e educadora na área de ministério infantil. Autora das coleções “Desafios do Ensino Bíblico” e “Andando Com Jesus“, materiais didáticos voltados para capacitação de lideranças e ministração de crianças em campos transculturais, é especialista e mentora em transição cultural. Atua no cuidado integral de missionários, preparando-os para a saída do Brasil e a chegada ao campo, além de acompanhar famílias e mulheres que vivem em outros países.

Atualmente, é missionária da Tarefa, atuando na área de cuidado, mentoria e materiais escritos, e integra diversas equipes, incluindo:

  • CMM (Confissões da Mulher Multicultural)
  • PitStop (Lugar para revisão de vida e ministério)
  • AME (Aliança Missões na Europa)
  • Polo Creative – Movimento das Artes Cristãs na Europa

Trajetória e Formação

Você tem uma formação ampla, atuando como psicóloga, bióloga, professora e educadora. Como essas diferentes áreas se conectam no seu ministério e missão?

Sou psicoterapeuta com muitos anos de vivências em clínica, educação e ensino. O acréscimo das experiências transculturais que experimentei favoreceram o desenvolvimento da visão do cuidado integral que faço hoje. Na minha compreensão, o cuidado integral inclui não só a saúde emocional, mas também tudo o que se relaciona com o trabalho que o missionário faz no local onde vive e atua. Se ele trabalha com o preparo de novos líderes locais, primeiro ele precisa passar pela sua própria capacitação, se ele trabalha com crianças além da capacitação ele precisa de bons materiais e saber usá-los com as crianças. Cuidado integral está intimamente ligado com o desenvolvimento pessoal e ministerial. Deus tem integrado todas estas áreas que transitei na caminhada pessoal e profissional no que atuo hoje.

O que a motivou a se especializar em transição cultural e no cuidado integral de missionários?

Ao entrar na área de missões, Deus foi “reformulando” a minha prática e me levando para a área do cuidado integral do missionário através de mentorias. As vivências que tive em outros países, Haiti, Alemanha, Uganda e agora Portugal despertou em mim o desejo de servir a igreja e levar a Palavra de Deus através do que Ele me preparou durante a vida. Hoje faço parte da Tarefa, uma agência missionária com foco em alcançar povos não alcançados. Temos um grupo grande de missionários em vários países e é importantíssimo que sejam acompanhados nas suas dificuldades. Viver em outra cultura traz grandes desafios em todos os sentidos. Nos deparamos com  as demandas emocionais do choque cultural, a aprendizagem da língua que nem sempre é fácil, o luto pelas perdas ao sair do Brasil e tantos outros desafios. O sucesso do seu ministério depende do sucesso do cuidado que recebe e tem de si.

Atuação no Cuidado Missionãrio

Como funciona o processo de preparação de missionários para a saída do Brasil e a chegada ao campo? Quais são os desafios mais comuns que eles enfrentam?

O preparo para a saída ao campo é fundamental. São muitos aspectos burocráticos que necessitam ser bem encaminhados, coisas práticas como desmonte da casa, despedidas e finalizações. Tudo isto é regado com muitos movimentos emocionais e intensos, que com frequência desestabilizam internamente. Durante o tempo que antecede a viagem existem expectativas em relação a mudança, inseguranças, muitas vezes os amigos e até família não compreendem o porquê da mudança. Tudo o que é necessário organizar tem um peso emocional maior do que o desgaste físico que a tarefa exigiu.  O desmonte da casa e as despedidas não são simples emocionalmente. Os desafios mais comuns desta fase são: cuidar da saúde emocional, resolver bem as questões relacionais que porventura ainda estão abertas para que possa sair “leve”, organizar todas as documentações e papeladas cuidando das datas. O processo de chegada também precisa de orientações específicas para sofrer o menos possível no choque cultural que acompanha os primeiros anos no campo.

Você também acompanha famílias e mulheres que vivem em outros países. Quais são as maiores dificuldades que elas enfrentam na adaptação cultural e espiritual?

O que eu tenho percebido com mais frequência se relaciona com o sentimento de pertencimento que demora para acontecer, a dificuldade de ajustes em relação aos comportamentos diferentes da cultura, a comunicação na língua local quando chega no país sem ter aprendido a língua. No caso de mulheres que vão sozinhas ao campo, elas precisam aprender como a mulher é vista naquela cultura, o que ela pode fazer e o que não, como ela deve se relacionar com as pessoas. No caso de famílias com filhos as dificuldades se apresentam em relação aos processos escolares e dificuldades com a língua até a criança aprender a se comunicar. Em relação às questões espirituais, em alguns lugares é muito difícil achar uma igreja local e quando acha é muito diferente da experiência brasileira. Em alguns países não é possível ter igrejas do modo como estamos acostumados, acontecem através de encontros em casas, ou até mesmo escondidos. Tudo isto gera um desgaste emocional que não pode ser desprezado.

Existe um caso ou testemunho marcante de transformação que você tenha presenciado através do seu trabalho?

O que tem acontecido com certa frequência é eu receber feedback positivo acerca de orientações específicas na necessidade que me foi relatada, na surpresa acerca do que apresentei e que nunca haviam pensado antes daquela forma. Também em relação a questões acerca do ser uma mulher sozinha no campo e ter que lidar com a solidão e sua identidade. Nas minhas conversas e mentorias eu reforço sempre a necessidade da pessoa se conhecer bem e compreender os seus processos internos para poder lidar melhor com a sua saúde emocional e relacional. Ao falar sobre estes assuntos percebo que ainda há desconhecimento da importância de investir no desenvolvimento emocional e consequentemente o que para mim é óbvio, para algumas pessoas é total novidade. Na caminhada missionária o autoconhecimento, o investimento na sua saúde emocional é fundamental para uma permanência frutífera no campo. Ser preparado emocionalmente é tão importante quanto ser preparado teologicamente.

Materiais Didáticos e Educação Infantil no Campo Missionário

Você é autora de materiais didáticos voltados para a capacitação de lideranças e ministração infantil em campos transculturais. O que te levou a desenvolver esses materiais?

O ministério que trabalhei por mais de 25 anos foi com as crianças. Transitei em todos os campos do Ministério infantil: como professora, coordenadora, com capacitação, elaboração de materiais para as aulas, acampamentos, orientação dos pais.

Fiquei muitos anos perguntando para Deus como eu poderia socializar os materiais que eu tinha escrito durante os meus trabalhos no Ministério Infantil e de que forma eles poderiam chegar aos que trabalham em outras culturas. E com o advento dos livros, cursos e vídeos pela internet comecei a ver que disponibilizar de forma online seria o caminho. Ao chegar na Europa eu fiz uma pesquisa com pastores e missionários de vários países sobre o ensino bíblico para as crianças, dificuldades encontradas e capacitações nesta área e constatei uma carência enorme de materiais para o preparo de professores e materiais pedagogicamente preparados para a ministração das crianças nesses países.

Como eu já havia publicado dois livros, decidi iniciar por eles numa segunda edição revisada nos quais fiz acréscimo de assuntos e orientações para líderes e missionários que atuam em campos transculturais com crianças.

Em 2015 publiquei, juntamente com Ana Cristina Schreiber, o livro Andando com Jesus que contém histórias bíblicas para Ministério Infantil, escolas e pais para um ano letivo.  A segunda edição deste livro se tornou a Coleção Andando com Jesus contendo as histórias bíblicas com novas atividades e orientações específicas para as adaptações do trabalho com crianças em contexto transcultural.

Em 2016 publiquei o livro Educação Cristã na Igreja – Perspectivas em Destaque com o foco no preparo ministerial do pastor e líder. A segunda edição se transformou na Coleção Desafios do Ensino Bíblico com sete livros e é praticamente uma capacitação. Escrevi de modo interativo onde o leitor no final de cada livro tem perguntas sobre os temas trabalhados no livro para auxiliá-lo a observar, refletir e analisar o contexto do seu trabalho, seja na igreja ou na missão. A intenção destas análises é provocar uma nova construção na sua visão da educação e como educador.

O meu desejo é que estes materiais e outros que virão pela frente possam servir aqueles que estão em campos transculturais.

Qual é a importância do ministério infantil no contexto missionário e como ele pode impactar comunidades inteiras?

Trabalhar com criança é formar uma pessoa para a vida, envolve a mudança que a conversão provoca no seu desenvolvimento. Ela é uma pessoa que pode ser protagonista na idade em que se encontra. O ensino da Palavra desde a tenra idade colabora e influi na formação do seu caráter, da sua personalidade, na sua visão de mundo e de futuro. Temos exemplos de crianças que se converteram e por causa de sua fé e testemunho, a família toda se converteu. Outros exemplos de crianças que foram mobilizadas por um desafio social e iniciaram campanhas para auxiliar aquela necessidade e Deus foi apresentado naquela ação. Por este motivo é fundamental abrirmos os olhos para o que tem sido feito com as crianças hoje e é nossa responsabilidade levá-las a Cristo através de ministrações consistentes e bem preparadas para que tenham mudança significativa na sua vida.  

Como adaptar o ensino cristão para crianças em diferentes culturas e realidades?

Primeiro é necessário que a pessoa que ministra crianças tenha tido uma boa capacitação na área do ensino bíblico para as crianças, adquirido conhecimentos acerca do desenvolvimento infantil para entender como falar com a criança e como ela aprende.  Com este preparo o missionário tem condições de avaliar o que está sendo proposto pelo material que ele usa e com sua experiência acerca da cultura onde está deveria conseguir criar atividades e conduções próprias para a cultura da criança. Mas nem sempre isto acontece, pois não é tão simples.  Por ter experimentado o trabalho com crianças nos países que andei, pude observar as dificuldades encontradas pela diferença de cultura. Por entender esta necessidade é que minhas duas coleções têm orientações específicas e sugestões criativas para o missionário fazer as adaptações necessárias.

Atuação nas Equipes e Projetos

Você faz parte de diversas iniciativas, como CMM (Confissões de Mulheres Multiculturais), PitStop e AME. Poderia nos contar um pouco sobre o papel de cada uma dessas organizações e como você contribui nelas?

Ao chegar em Portugal conheci os grupos da Aliança Missões na Europa – AME e já me integrei sendo convidada a participar de lives e mentorias.  A AME tem grupos de whatsapp para pastores, líderes e missionários brasileiros em todos os países e promove cursos, palestras, ensino de línguas e conteúdos importantes para quem está ou vem para Europa.

Logo em seguida conheci a psicóloga coordenadora do PitStop que me convidou a fazer parte da equipe. Este é um espaço em Sintra para restauração, descanso, revisão de vida pessoal e ministerial. A família ou a pessoa vem por duas semanas para ser ministrada através do cuidado integral.

Eu conheci a Valeska quando estive na casa dela na Uganda e acompanhava o seu trabalho quando ela me convidou para fazer parte da equipe do CMM. Neste grupo trabalhamos com mulheres missionárias que moram em diversos países auxiliando-as nas suas demandas, capacitando através dos nossos encontros, mentorias, workshops e conteúdos no site.

A minha contribuição em cada uma delas se dá pela minha atuação na visão que tenho acerca do cuidado integral e das ações que posso compartilhar.

Como foi sua entrada no Movimento das Artes Cristãs do Polo Criative e qual a importância da arte dentro do contexto missionário?

Conheci a Verônica logo que ela chegou em Portugal e iniciamos boas conversas acerca da arte no contexto missionário. Eu acredito que a arte expressa o caráter criativo de Deus através das suas múltiplas formas. E fico maravilhada com esta faceta da Sua imagem e semelhança refletida em nós. A arte, seja qual for a sua expressão, traz um toque profundo em lugares da alma que o senso comum não alcança.

O meu lugar neste espaço criativo é através da escrita de materiais para capacitação e preparo daqueles que estão em contato direto com os ainda não alcançados pelo evangelho, escrita de histórias bíblicas para a ministração de crianças com todas as orientações pedagógicas necessárias para o preparo de quem vai ministrar, reflexões através de textos e poesias. (andandocomjesus.com/solidao-mergulho-na-alma/)    

Participei da I Expo Polo Criative fazendo o lançamento destes materiais.

Perspectivas e Projetos Futuros

Quais são seus próximos projetos e sonhos dentro do seu chamado ministerial?

No momento estou finalizando dois livros para o preparo da família e de quem vai fazer transição cultural. Um livro para o preparo e a organização dos adultos, tanto burocrática quanto emocional e o outro para o preparo da criança. Este livro da criança vai ser interativo no qual a criança vai fazer uma viagem por todos os continentes e descobrir muitas coisas sobre cada um deles. Os dois livros serão lançados ainda neste semestre.

E eu estou sempre aberta para o que Deus me apresenta e me desafia. Por causa desta disponibilidade interna Ele já me levou a caminhos que tenho experimentado que nunca havia imaginado antes e tem sido muito bom!

Para aqueles que sentem o desejo de se envolver com missões, mas não sabem por onde começar, qual conselho você daria?

Seguem algumas dicas importantes:

  • Abra o seu coração diante de Deus para se permitir experimentar algo novo;
  • Busque palestras, conferências, cursos sobre o tema para escutar aqueles que já andam em missões. Um curso maravilhoso para este início é o Perspectivas (link);
  • Estude inglês que é falado em qualquer país que vá. Se já tem um país em mente, comece a estudar a sua língua oficial além do inglês;
  • Pesquise várias agências para entender o seu foco de trabalho, onde atuam, como se relacionam com seus missionários para ver qual delas se aproxima mais do que Deus tem mostrado a você;
  • E algo muito importante é ser bem acompanhado na preparação para a saída e a chegada. São tempos de muitos movimentos emocionais que precisam ser bem cuidados.

Estas são as dicas iniciais porque durante o processo de  transição muitos imprevistos acontecem e precisam ser enfrentados.

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